quarta-feira, 8 de agosto de 2012

PERGUNTAS DE UM TRABALHADOR GREVISTA, Prof. Dr. Tadeu João Ribeiro Baptista FEF/UFG

PERGUNTAS DE UM TRABALHADOR GREVISTA

Prof. Dr. Tadeu João Ribeiro Baptista
FEF/UFG



Ao longo dos meus 44 anos neste momento, tenho vivenciado muitas coisas boas e ruins apresentadas pelo mundo. Tenho como todos os seres humanos existentes no planeta, sentido tristezas, alegrias, raiva, mágoas, rancor, desejos, sensação de perda e de vitória, de fé, de desespero e, em uma quantidade cada vez maior em minha vida, a sensação de dúvida e de indignação.
Neste momento, como vários outros trabalhadores federais, estaduais e municipais neste país estou em greve. Greve por entender que preciso de melhores condições de trabalho. Greve porque entendo que, como todas as outras pessoas participantes deste movimento, tenho direito à remuneração justa, a qual seja minimamente suficiente para atender às necessidades de um pai de família. Greve, porque
entendo que as condições de carreira presentes nos projetos governamentais devastam não apenas aqueles que já optaram pela vida acadêmica, mas compromete a entrada de pessoas sérias e capazes que talvez farão outras opções para obter condições dignas de trabalho e existência.
Esta greve, da qual participo de maneira tímida, é feita por mulheres e homens que como eu acreditam ser necessárias a manutenção do ensino público para os meus filhos e filhas, netos e netas e demais descendentes, como também os descendentes de todos os cidadãos e cidadãs deste país tenham direito à educação superior pública de qualidade.
A greve que participo não é a primeira de minha vida. A primeira greve que presenciei de forma mais próxima aconteceu em 1986, quando os professores da Escola Superior de Educação Física de Goiás - ESEFEGO, naquela época uma das melhores do país, interromperam as suas atividades por questões muito semelhantes àquelas pelas quais eu luto hoje: condições de trabalho, salário digno e respeito dos governantes. O contexto com certeza era diferente, pois, o país havia acabado de sair da ditadura militar de 20 anos e hoje, por incrível que possa parecer temos, após outros 20 anos, a oposição daquela época comandando os destinos do país.
Talvez tenhamos ainda outro grande problema neste contexto. As pessoas que participavam dos movimentos sociais, que reivindicavam a melhoria dos salários e que sabiam como conduzir a classe trabalhadora em sua luta. Hoje, estas pessoas adotam a postura questionada e combatida por eles mesmos naquele momento e nos anos de chumbo anteriores. Daí vem a primeira pergunta: seria muito pedir que eles se lembrassem de sua história e dos compromissos assumidos com a classe subalterna na visão de Gramsci e que com certeza contribuiu para a sua eleição?
Mas, neste manifesto de indignação, existem outros incômodos e outros questionamentos a serem feitos, até porque, o partido que está no poder se deixou contaminar ou não teve forças para fazer as transformações de base na história da sociedade brasileira. Outras questões, de maneira mais imediata são mais gritantes para este trabalhador em greve.
Durante a minha docência no ensino superior, ao acompanhar os movimentos de luta da classe trabalhadora contra aqueles que os exploram e enriquecem, percebi o movimento que entendo como sendo um dos mais sórdidos nas lutas sociais: o movimento de minar as resistências da luta.
Na minha ingenuidade política e na minha incapacidade de ação, consigo compreender que mesmo um partido oriundo da classe trabalhadora adote uma postura contrária quando se torna patrão. Consigo entender o jogo da grande mídia, sempre vinculada aos interesses do capital nacional e internacional, em tratar o movimento de greve como subversão à ordem estabelecida, como também, eu já estou acostumado com a frase que aparece nos jornais nacionais para falar de greve de professores como eu que iniciam com o bordão: “milhares de alunos estão sendo prejudicados pela greve dos professores da rede pública que hoje completa mais um dia...”.
Eu também consigo compreender aqueles trabalhadores, os quais provavelmente seriam considerados ingênuos por Paulo Freire não participam das greves porque concordam com as condições apresentadas ou porque, em uma ação egoísta, procuram identificar o impacto do movimento em sua vida pessoal e não se comprometem com as questões apresentadas. Mas tenho certeza que muitas destas pessoas se sentem felizes com os seus aumentos de salário, com as pequenas conquistas alcançadas e com a manutenção ou melhoria de seus planos de carreira ao final da greve. Mas será isso verdade?
Já compreendi que por não compartilhar com os propósitos das lutas, com a radicalidade daqueles que comandam o movimento, ou simplesmente porque são contra qualquer tipo de greve ou movimento social, são auto alijados do processo. Eu consigo, inclusive compreender, que como ele já se converteu em máquina ou apêndice dela como diria o velho Marx, ou por ter se reificado plenamente como diria Lukács, estas pessoas querem não só manter as condições atuais, como acreditam que as condições dadas, inclusive para eles, são insuficientes para aumentar a produção. Talvez, eles tenham a ilusão de, como trabalhadores, tornarem-se ricos apenas com o suor de seu labor, sem ter a noção de que ao vender a sua força de trabalho, venderam junto a sua vida e concordaram em se submeter às condições de trabalho apresentadas pelo comprador dessa mercadoria: o seu patrão.
Mas, uma coisa está muito além da minha capacidade de compreensão. Como, neste momento da história, aqueles que, aparentemente, possuem maior clareza das condições da classe trabalhadora, que se predispõe a doar parte de sua vida em nome das lutas de sua categoria profissional, os quais deveriam ter como princípio a organização democrática, suplantam estes ideais e adotam posturas contrárias a estes interesses.
Não sou a pessoa mais combativa do mundo, mas a minha parca compreensão dos movimentos sociais, trazem a mim um questionamento central: Por que as pessoas que deveriam comandar os movimentos sociais e lutar pelo alcance de seus interesses, passam a adotar os interesses contrários àqueles de quem são representantes?
Na minha história de greve, já vi estudantes reclamarem que não tinham sabão para lavar a mão durante o estágio, mas que eram contra a greve, já vi professores dizerem que como a nossa condição estava atrelada as condições do país, as quais não poderiam ser mudadas e, por isso, o melhor era acabar com a greve. Já vi professores e funcionários reclamarem das possíveis perdas para as suas férias, porque o pacote de viagem já estava comprado e eles teriam que fazer reposição. Já vi pessoas dizerem que greve não se faz porque isso só atrapalha. Mas, porque a direção do sindicato, não só procura evitar a greve que deveria ser chamada por eles, como faz tudo para evitar que as conquistas e a pauta de negociações se deem de forma democrática?
Que sentido tem, uma diretoria sindical rasgar o seu estatuto e desrespeitar a decisão da assembleia da qual participam, utilizando outros recursos para desarticular o movimento? Que interesse tem estes dirigentes, ao trair a categoria que os elegeu? Enfim, o que pensar das pessoas que não participam dos debates e não apresentam as respostas do que foi questionado? Haverá algum outro interesse que não seja o interesse da assembleia legítima da qual participam?
Enfim, eu gostaria que alguém com maior capacidade política e inteligência que eu, pudesse responder a algumas destas questões, porque, como humilde trabalhador alienado que sou, não consigo lidar com questões desta monta. Como intelectual e filósofo por ter nascido humano como diria Gramsci, eu estou aquém daqueles que são filósofos e intelectuais orgânicos por ofício. Finalmente, termino dizendo com Ramos-de-Oliveira: contra a rinocerontização da humanidade, não me calo, resisto.

Agosto de 2012.

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